quarta-feira, 24 de julho de 2013

As perspectivas profissionais da docência jurídica




A docência jurídica é sem dúvida uma das profissões que mais tem se expandido. Em razão do grande número de cursos direito, tem sido abertos um número expressivo de postos de trabalho. Segundo dados da ABEDI (Associação Brasileira de Ensino de Direito) são mais de 650 mil alunos (o curso de Direito é o segundo no país em número de matrículas), o que resulta em aproximadamente 100 mil bacharéis formados anualmente.


Os números indicam a proporção da força de trabalho docente existente no mundo jurídico. Essa constatação poderia ensejar o entendimento de ser o professor de Direito alguém bem remunerado. Todavia, o grande número de cursos de Direito vem combinado com um outro fator: o magistério é a categoria profissional do Direito que mais mal remunera seus membros (se compararmos com qualquer outra profissão que exija diploma em Direito, os salários dos professores são os mais baixos).

A associação desses fatores tem gerado um paradoxo no ensino jurídico. Por um lado há aqueles que faturam muito com a difusão de conhecimentos jurídicos e, de outro, uma grande leva de professores que encontram, nas faculdades, uma mera alternativa de trabalho (muitos optam pela docência jurídica após fracassar na tentativa de ingresso em outras carreiras).

É, assim, comum o ingresso na docência jurídica de bacharéis que não obtiveram êxito em profissões de maior prestígio. Afinal, há oferta de aulas por salários baixos para o Direito, mas ainda razoáveis se comparados a outras atividades (comparando com a média nacional, o valor de R$ 400,00 para quatro horas de aula é um bom salário!).

Ironicamente, percebe-se que as faculdades de Direito, em maior ou menor número, tem sempre um albergue para os frustrados do Direito.
Cabe lembrar que não estamos falando da totalidade do magistério, mas sim de uma proporção crescente. Existem alunos que teriam interesse e potencial para a docência, porém deixam o ambiente acadêmico como segunda opção (quando adentram em carreira de maior segurança financeira, dedicam-se e apenas parcialmente à academia).


O processo de depreciação da docência é um fenômeno que atinge tanto as instituições privadas quanto as públicas. Basta ver que o pior salário do Poder Executivo é o dos professores da rede federal (Jornal Folha de São Paulo, de 02.07.2012). Cerca de um quarto das vagas para docentes de estabelecimentos de ensino federais de São Paulo não são preenchidas. Este número reflete o desânimo daqueles que aplicaram no mínimo seis anos de suas vidas na obtenção de titulação (mestre ou doutor), na ampla maioria das vezes com recursos próprios e com sacrifício financeiro, para depois constatarem que o salário oferecido é muitas vezes inferior ao de um serventuário da justiça de nível médio.

Desse modo, na opção pelo magistério jurídico, tem predominado duas situações: a já mencionada daqueles que, após o insucesso em outras incursões profissionais, conseguem "umas aulinhas" e, a daqueles que obtém sucesso em outras profissões e fazem da docência uma atividade secundária motivada por razões existenciais ou porque útil para alavancar suas finanças explorando grandes nichos econômicos do ensino jurídico (como a preparação para concursos públicos e cursos de atualização).

Em suma: o número de ingressantes no magistério jurídico que o vêem como vocação cultivada deste cedo, para o qual se preparam durante longo tempo e que o exercem como opção exclusiva é cada vez menor.

Este cenário de desalento ainda mais se agrava quando aqueles que fazem a opção pelo magistério depois de sucessivos fracassos profissionais se engalfinham em disciplinas propedêuticas, partindo do pressuposto de que estas são "menos importantes", são "as rejeitadas pelos alunos", "são uma viagem" ou - um argumento comum e o pior de todos - "não são direito", ou seja, não fazem parte da ciência jurídica.

O que ocorre é que essas disciplinas exigem uma capacidade maior de abstração. Exigem "viagens" com escalas para fundamentar a prática cotidiana e possibilitar a conscientização da ação dos juristas, evitando a mera repetição irrefletida de uma atuação. O descaso para com estas disciplinas tem consequências terríveis!

Diante disso, torna-se urgente pensar o lugar do professor no quadro das profissões jurídicas, olhar para a formação de quadros e promover e valorizar a docência, sob pena de se fazer muito "ensino" jurídico, mas com pouca (ou nenhuma) qualidade.


Samuel Mânica Radaelli - GEDIS
 

segunda-feira, 1 de julho de 2013

A direita no armário



"Agora, nega também a diferença entre esquerda e
direita, sustentando uma 'ordem política' em que não
se pode levantar bandeiras nem defender ideias. Assim,
dá um caráter natural aos seus interesses, no intuito de
que o pobre vá às ruas para defender o rico."

A direita brasileira tem causado espanto por sua preocupação em enrustir-se, negando justamente a diferença entre esquerda e direita. Ao negar essa diferença não assume, de forma franca, a sua prática e a dos seus militantes. Percebe-se que a direita brasileira sucessivamente vem negando, também, uma série de outras diferenças, nesta ordem: 1) entre ricos e pobres; 2) entre patrões e empregados; 3) entre brancos, negros e índios; 4) entre homem e mulher.
Agora, nega também a diferença entre esquerda e direita, sustentando uma “ordem política” em que não se pode levantar bandeiras nem defender ideias. Assim, dá um caráter natural aos seus interesses, no intuito de que o pobre vá às ruas para defender o rico.
Essa atuação camaleônica visa universalizar seus interesses, criando um jogo de subalternidade e imitação à medida que estabelece sua ordem como autêntica, afirmando que todos os que são bons podem atingir o poder econômico e político e por isso todos devem defendê-la; por conta disso tem-se a figura patética do sujeito que ganha R$ 10mil por mês e se sente sócio do Bill Gates, e por tal razão pensa em defender interesses comuns a ambos.
É preciso prevenção em relação ao neoconservadorismo expresso na atitude de criticar todos os políticos e votar sempre nos mesmos.
A atitude dissimuladora das forças conservadoras no Brasil pode revelar aspectos positivos como a fragilidade argumentativa na defesa de suas posições, contudo, embora o fato de que majoritariamente existe constrangimento em admitir pertencer à direita – o que reflete a pouca credibilidade do conservadorismo –, isso não é devido ao esgotamento de sua posição social.
Diante do desgaste de sua imagem a direita muda de “rótulo”, buscando possibilitar que seus agentes públicos possam atuar advogando interesses burgueses sob o manto da imparcialidade política, como forma de ocultar e absolver sua prática. A burguesia se sustenta porque consegue universalizar seus valores: para isso, não possui apegos identidários, praticando a reinvenção constante de sua imagem.
A direita está no armário. O problema é que ela se “transveste” da democracia e da neutralidade política.

Samuel Mânica Radaelli – GEDIS