O tema da redação do Enem 2015 foi “A persistência da
violência contra a mulher na sociedade brasileira”. Em muito boa hora: na
quarta-feira passada, dia 21/10/2015, a Comissão de Constituição e Justiça da
Câmara dos Deputados aprovou a proposta de lei que visa dificultar o acesso à
pílula do dia seguinte e a tratamentos abortivos, mesmo às mulheres que foram
estupradas.
A violência contra a mulher está tão infiltrada em nosso
cotidiano que, muitas vezes, nem sequer a percebemos. Já estamos tão
acostumados que essa triste realidade tornou-se um simples detalhe de plano de
fundo da sociedade.
Por incrível que pareça, estamos acostumados com a cultura
do estupro. Chegamos a aconselhar nossas meninas a vestirem-se de certa forma
que não atraia olhares e desejos de estupradores em potencial. Mas vamos além:
culpamos aquela moça que transgrediu essa regra, afinal, minissaia, sozinha à
noite é igual a “pedir para ser estuprada”.
Estamos acostumados com o terceiro turno feminino. A mulher
trabalha, estuda, volta para casa e precisa cuidar dos filhos e fazer comida
para si, para as crianças e... para o marido! Isso ainda é uma realidade em
muitas famílias, mas não deixa de ser uma violência contra a mulher.
A mulher é assediada no trabalho, na rua, na universidade,
na escola. Afinal, temos como normal que o homem tenha mais desejo sexual do
que a mulher. O desrespeito é normal, o constrangimento feminino é normal, a
crueldade logo passa a ser normal. Mas, não satisfeitos com esse vergonhoso
contexto social, novamente vamos além: orientamos as mulheres a “não dar mole”,
a “cuidar suas condutas”. Castramos as mulheres, fazendo-as duplamente vítimas:
a uma, porque foram vítimas do assédio; a duas, porque não se comportaram da
forma adequada para evitar o assédio!
A violência contra a mulher vai além da agressão física.
Aliás, essa é apenas a ponta de um gigantesco iceberg. Ela está em nosso
dia-a-dia, principalmente no dia-a-dia das mulheres. Ela atua contra a
sexualidade da mulher, contra o comportamento da mulher, contra a identidade da
mulher, contra o trabalho da mulher, contra o corpo da mulher.
Como se não bastasse, alguns sujeitos morbidamente
instalados na Câmara dos Deputados decidiram ajudar: resolveram dificultar
ainda mais a vida da mulher – veja, e não de qualquer mulher, mas da mulher
vítima, a mulher estuprada, a mulher em crise. Em nome de uma bancada
pseudo-religiosa, os direitos das mulheres são novamente alvejados.
A ala conservadora vem conseguindo atingir seus objetivos:
conservar a triste, humilhante e sofrida realidade da mulher brasileira na
atualidade.
Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis
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