sábado, 29 de outubro de 2011

DA SÉRIE "TRABALHO AOS DOMINGOS": “Abençoou Deus o sétimo dia, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que criara e fizera” (Gênesis, 2.2-3)



Quando a questão é religião, cautela e brandura são imprescindíveis. A uma porque todas as crenças são defensáveis e, a duas, porque cada indivíduo tanto tem sua liberdade de crença quanto de manifestação constitucionalmente protegidas. Todavia, a questão que aqui será abordada é extremamente mais melindrosa.
Antes de qualquer coisa, é preciso considerar a importância da religião (seja qual for) para a sociedade. Histórica, cultural e economicamente as comunidades, desde muito antes do surgimento do direito, se pautavam pela superioridade das normas “estabelecidas” pelas entidades que cultuavam.
Logicamente com a evolução da humanidade o direito veio aprimorar e equilibrar as relações interpessoais, já que a religião surge, primordialmente, com o intuito de intimidar o indivíduo e, diante das inúmeras condições revolucionárias e intelectuais, o homem passou a questionar tais determinações. A positivação de regras logo se faria necessária a fim de controlar as comunidades.
Ainda nos dias atuais a sociedade muito se pauta nos ensinamentos religiosos. Há, portanto, uma cooperação entre o Direito e as entidades religiosas com a finalidade de apaziguar a vivência em comunidade, que é, espontaneamente, circundada pelos embates, até porque, sendo a população infindavelmente crescente, tornam-se, os conflitos de interesses, absolutamente naturais.
Inegável (diante dos dados levantados pelo último senso) que parte maçante da população brasileira é cristã, se pautando, portanto, pelos
ensinamentos bíblicos. Desta feita, parte-se do princípio de que seguem, na ampla maioria, os legados escritos pelo apóstolo do Cristo.
Segundo o ensinamento de Gênesis 2.2-3, no sétimo dia, Deus disse: "Ora, havendo Deus completado no dia sétimo a obra que tinha feito, descansou nesse dia de toda a obra que fizera. Abençoou Deus o sétimo dia, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que criara e fizera".
Não há qualquer escopo em entrar no mérito de qual é o sétimo dia (já que apresenta divergência entre as diferentes religiões), primeiro porque a questão tem cunho histórico, religioso e cultural, e segundo porque o que se pretende ressaltar é que desde os mais remotos tempos o homem teve um dia destinado ao ócio e a adoração, seguindo os parâmetros de Deus, que o fez a sua imagem e semelhança.
Todavia, parte da sociedade, movida por um crescimento e interesse pelo desenvolvimento econômico desenfreado, passou a deixar de lado a prática religiosa e, consequentemente, outra parte da sociedade foi violentada a se adaptar a nova necessidade imposta. Explico: aos trabalhadores são cominadas condições sub-humanas de ofício e exageradamente excessivas, como o labor aos domingos - que tradicionalmente era um dia para ser “guardado” -, diante dessa aflição por desenvolvimento e de falsas premissas criadas pela coletividade.
É defensável que a nossa Carta Constituinte não obriga que o repouso semanal seja aos domingos, especificamente. No entanto, é igualmente defensável que o trabalhador, diante da sua liberdade de crença, tem um direito atravancado a partir do momento de que para de alimentar sua espiritualidade.
E muito pior do que a simples obstrução do exercício de um direito seria a negação absoluta da importância da religião para sociedade. Claramente a convivência humana se tornaria caótica, sob a perspectiva de colaboração que as normas espirituais exercem de forma conjunta às coercitivas impostas pelo Estado.
Dos ensinamentos de John Locke subtrai-se que a finalidade do direito “não é abolir nem restringir, mas preservar e ampliar a liberdade”. Não há o interesse econômico de ser superior às praticas religiosas, já que são visivelmente mantedoras do equilíbrio da humanidade.
Pautem-se em fatos e definições fictícias/abstratas ou não, são as práticas religiosas reverenciadas e norteadoras da vida humana desde os primórdios da humanidade e dificultar (pra não dizer impossibilitar) o seu exercício seria um retrocesso tamanho tendente a dar cabo à harmonia da vida humana.

Mayra Grezel - GEDIS

terça-feira, 25 de outubro de 2011

POLÍCIA MILITAR – (in)admistração da segurança pública

Eduardo Pianalto de Azevedo


Considerações Iniciais


Há algumas semanas a questão sobre o registro de ocorrências policiais gerou séria crise nos setores ligados a segurança pública do Estado, colocando em enfrentamento as polícias civil e militar.
O mote de toda a divergência seria o registro de ocorrências policiais, antes afeto à Polícia Civil e que passou a ser atribuição também da Polícia Militar.
A bem da verdade, a divergência não se dá apenas e tão somente pelo privilégio e exclusividade de um ou outro órgão policial registrar os fatos pretensamente criminosos, mas pelo poder que daí decorre e as inerentes atividades de investigação advindas.
O curioso é observar, a primeira vista, que duas instituições antagonizem-se pela exclusividade de trabalhar, de registrar ocorrências policiais.
Por outro lado, é salutar e sensibilizante constatar-se tamanha disputa pelo afã  de servir a população.
O registro de um fato, criminoso ou não, sempre existiu, quer pela Polícia Civil quer pela Polícia Militar.
São esses dados que alimentam e subsidiam inúmeras atividades policiais, na medida em que informam a incidência desse ou daquele crime, a maior ou menor criminalidade etc.
Dados, sem sombra de dúvida, de importância, embora não sejam as únicas informações subsidiadoras da atividade policial.
Entretanto, o que a maioria das pessoas desconhece é que muitas das decisões e medidas implementadas em nível estadual, como é o caso da recente unificação dos registros de ocorrências e mesmo no desempenho, pela Polícia Militar, de atividades típicas de polícia judiciária, como é o caso da elaboração dos Termos Circunstanciados, e, agora, dos registros de ocorrência unificados, têm sua origem em nível federal.
Tais medidas possuem gênese na Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP, quando em 2009, elaborou o denominado “Programa de Pleno Atendimento ao Cidadão”, matriz de uma intervenção na estrutura dos Estados, através da capacitação de policiais militares para o desempenho de tarefas típicas de Polícia Judiciária.
Sob o ponto de vista crítico, temos, em tal programa, um modelo nacional único de apuração das infrações de menor potencial ofensivo, com inegável dispêndio de recursos públicos e inquestionável prejuízo à prevenção dos delitos pela via ostensiva.[1]
Para alguns pensadores, essa idéia do “ciclo completo de polícia”, através da reunião das tarefas do policiamento ostensivo com funções próprias de investigação criminal, traz inúmeros problemas, com destaque ao rompimento da separação de atribuições e a salutar fiscalização dele decorrente, bem como do inegável prejuízo as atividades de policiamento preventivo.
De outra banda, a medida justificar-se-ia pela anemia orçamentária do Estado que, através da maior judicialização (maior número possível de elaboração de Termos Circunstanciados), obteria um maior retorno financeiro e poderia minimizar a carência de recursos aos órgãos de segurança.
A conclusão não é sem razão, basta observar-se a quantidade de recursos, notadamente em crimes ambientais, que são carreadas aos órgãos de segurança decorrentes de Transações Penais e imposição de penas restritivas de direitos.

Polícia Preventiva e Polícia Repressiva
  
A atividade policial, grosso modo, existe em duas instâncias: uma preventiva, que se dá antes da prática do crime, e outra repressiva, que ocorre após o crime.
Para tanto, foram desenvolvidas e especializadas duas polícias, uma de caráter e atuação iminentemente repressiva, que é a Polícia Judiciária, também conhecida como Polícia Civil; e outra de atuação preventiva que é a Polícia Militar.[2]
Em que pese, no fenômeno segurança pública, possam existir algumas variantes, a atividade policial, basicamente, dá-se nessas duas instâncias.
O que a opinião pública não sabe é que, com bastante freqüência, a Polícia Militar sai de sua esfera de atuação, para atender demandas que não são de sua alçada, com reflexos imediatos, para não dizer prejuízos, ao atendimento de sua tarefa precípua: policiamento ostensivo fardado.
Uma das maiores, se não a maior, reclamações referentes à segurança pública consiste na falta de policiamento ostensivo e a demora no atendimento das ocorrências policiais.
 Na medida em que se constatam as disfunções (distorções) da Polícia Militar, passa a se compreender melhor as razões de tais deficiências e nos reflexos prejuízos à segurança pública dos cidadãos.
É comum ver-se policiais militares no policiamento interno de estádios de futebol, entretanto, não é essa uma tarefa afeta a Polícia Militar. E, importante gisar-se, a Polícia Militar somente atua nesses espetáculos porque é paga para tanto.[3]
Tratam-se de espetáculos particulares, pertencentes a empresas privadas (times de futebol), para o qual seus espectadores pagam um preço, ou seja o ingresso, no qual fica incluído, além do espetáculo, a segurança e demais encargos inerentes.
Fica uma pergunta: Você alguma vez viu policiais militares trabalhando no interior de cinemas, teatros ou qualquer outro espetáculo privado.
Vê-se, portanto, que a Polícia Militar somente atua nos campos de futebol porque é paga para fazê-lo, pois os clubes têm de pagar taxas para obterem essa espécie de policiamento privado.
É de se questionar a razão de tal opção, o policiamento pela polícia militar invés da contratação de uma segurança privada.
De outra parte, não é difícil concluir-se que o policial que se encontra no estádio, por conseqüência, não estará na rua.
O curioso é que para atender essa demanda, os policiais militares, por vezes, são forçados a realizarem horas-extras. Coisa que raramente é exigida para o atendimento do policiamento comum, aquele que é dever precípuo da Polícia Militar.
A segurança bancária também é, inúmeras vezes, realizada pela Polícia Militar, num espetáculo que beira o absurdo, pois, não raro, vêem-se viaturas policiais escoltando veículos de transporte de valores.
Para tanto, deslocam-se viaturas e policiais que deveriam estar prestando o “serviço público” de segurança, para o qual todo cidadão paga seus impostos, no desempenho de atividade privada de segurança.
É quase uma piada, policiais escoltando “carros-fortes”, veículos especialmente destinados ao transporte de valores, pertencentes a empresas privadas, que, no entanto, pagam ao Estado para terem esse exclusivo serviço de segurança Pública.
Não é difícil adivinhar que continuam faltando policiais na rua.
Há outras situações absurdas.
A presença da polícia militar em alguns órgãos públicos, numa atividade de policiamento exclusivo e personalíssimo, não é rara, embora alguns órgãos para os quais são prestadas tais atividades, possuam serviços próprios de segurança.
É o caso da Assembléia Legislativa e do Tribunal de Justiça, por exemplo.
Trata-se de um número considerável de policiais que se encontram prestando serviços nesses órgãos. E, diga-se de passagem, serviços esses que são prestados com exclusividade e disputadíssimos pelos profissionais da área, pois trazem inegáveis e ambicionadas vantagens financeiras.
As mazelas surgidas nas polícias brasileiras, em especial na Polícia Militar, têm origem na década de 60, em decorrência da chamada “revolução de 64”, quando houve uma total reformulação das polícias no país, com extinção das atividades de polícia preventiva realizadas pela Polícia Civil e a reestruturação das polícias militares, que passaram a ser forças auxiliares do exército.
Em parte essa mudança deve-se ao famoso episódio denominado “Legalidade”, quando o Governado gaúcho Leonel de Moura Brizola defendeu, após a renúncia de Jânio Quadros, a posse de João Goulart, então vice-presidente da república, que para os militares era pessoa “não grata” e que não queriam que tomassem posse no lugar do presidente demissionário.
Entretanto, isso é história, que, no momento, não interessa, apenas justifica a mencionada reformulação das polícias militares e sua subordinação às Forças Armadas, posto que não eram, à época, instituições confiáveis.
Retornando as questões pontuais atinentes às Polícias Militares, cabe ressaltar o emprego das polícias militares no atendimento de ocorrências de trânsito (acidentes), nos casos em que não resulte vítima.
Os acidentes de trânsito sem vítimas, salvo raríssimas exceções, não constituem qualquer crime ou contravenção penal e, por conseqüência, não tem as polícias qualquer dever de seu atendimento.
O atendimento que é feito, e que na maioria das vezes resume-se a um registro de ocorrência, somente é realizado porque o Estado arrecada através do pagamento de taxas.
Inúmeras vezes os policiais são deslocados para tais atendimentos, com reflexos inquestionáveis no policiamento preventivo, ainda que tal função não seja de competência da Polícia Militar ou mesmo da Polícia Civil[4].
O mais absurdo é que muitas instituições bancárias, ainda que “ao arrepio da lei”, fazem exigência de tal registro policial para o pagamento de seguro referente aos danos dos veículos.
Isso para não se falar dos “croquis” de levantamento de acidente, realizados, em que pese a boa vontade dos policiais, sem qualquer rigor técnico ou científico e, por conseqüência, despido de valor probatório.
A exigência o registro do acidente em órgãos policiais e o atendimento por órgãos policiais não encontra qualquer fundamento legal, embora tenha se tornado praxe e nada se fez ou faz para mudar tal realidade.
O prejuízo ao policiamento ostensivo é mais uma vez evidente.
E note-se que em muitas cidades do país, os serviços de trânsito passaram a alçada das polícias municipais, como é o caso de Chapecó\SC.

A realidade vivenciada

Para se ter uma idéia melhor das distorções na questão da segurança pública e, em especial, das atividades da Polícia Militar, que é necessário destacar-se padece os efeitos de uma falta de políticas públicas e planejamento, vamos a uma breve análise da 3ª. Cia, órgão integrante do 2º. Batalhão da Polícia Militar e da Polícia Civil, ambas no município de Chapecó, com base em dados de setembro do corrente ano de 2011.
Considerando-se o efetivo de policiais disponibilizados para investigação pela Polícia Militar, comparativamente com o da Polícia Civil, os resultados, pelo menos aqueles anunciados na mídia, são pífios.
Note-se que o número de policiais militares disponibilizados para investigação (Tarefa incumbida ao órgão denominado P2), tarefa que técnica e juridicamente seria de primazia da Polícia Civil, corresponde a um total de dez (10) policiais militares, praticamente todo o efetivo policial civil disponibilizado para investigação, que é de catorze (14) policiais. Nunca esquecendo que o policiamento ostensivo é o que deveria ser priorizado pela Polícia Militar. Policiamento ostensivo esse cujo principal desiderato seria (ou teria por objetivo) prevenir a criminalidade, ou seja, evitar que os crimes que são investigados, viessem a ser praticados.
Deve-se acrescentar que, atualmente, segundo informações obtidas, além dos referidos dos dez (10) policiais militares em atividade de investigações junto ao 2º. Batalhão da Polícia Militar de Chapecó, teríamos outros seis (06), incluindo-se um oficial, engajados na mesma espécie de atividade junto ao Ministério Público da Comarca.
Observa-se, desta forma, que o efetivo de policiais militares (16 policiais) em atividades de investigação no município é maior do que aquele disponibilizado pela Polícia Civil, cujos órgãos originariamente teriam a incumbência legal de tais atividades.
De certa forma, temos, portanto, uma espécie de inversão na atividade de segurança, pois ao invés de trabalhar-se para impedir ou evitar-se a criminalidade, tarefa fim e exclusiva da Polícia Militar, passa-se a investigar aqueles crimes que não foram impedidos ou evitados.
Observe-se que, na Polícia Civil de Chapecó, há um total de catorze (14) policiais com tarefas específicas de investigação, sendo este total o somatório de todos os órgãos policiais da cidade, que compreende cinco (5) unidades policiais, conforme gráfico a seguir:

1ª. DP de Polícia - dois (02) investigadores;
2ª. DP de Polícia - dois (02) investigadores;
3ª. DP de Polícia - dois (02)  investigadores;
DP Mulher e Adolescente - dois (02) investigadores;
Divisão de Investigações - seis (06) investigadores.
Total – catorze (14) investigadores.
Polícia Militar: dez (10) na 3ª. Cia
                        Seis (06) no MP

O Efetivo total apurado na 3ª. Cia de Polícia Militar, órgão de atuação no município de Chapecó, é de duzentos e dezenove (219) policiais, sendo que sessenta (60) policiais desempenham atividades burocráticas, não participando da atividade fim da instituição, que é o policiamento preventivo ostensivo fardado. Limitam-se, pois, ao desempenho de atividades burocráticas, sendo que algumas delas em concorrência com a própria Polícia Civil.
Os policiais que desempenham atividades burocráticas representam 27% do efetivo total da 3ª. Cia, ou seja, isto significa dizer que praticamente 1\3 dos policiais militares lotados em Chapecó não exercem atividades de policiamento, mas apenas como já enfatizei funções burocráticas.
A Polícia Militar, atualmente, disponibiliza policiais para execução de diversas funções burocráticas; as quais, na realidade, não teriam obrigação de desempenhar, além de haver ainda funções que são desempenhadas em duplicidade com outros órgãos, como é o caso da elaboração de Termos Circunstanciados, em que faz em concorrência com a Polícia Civil.
A tarefa de polícia judiciária, como já foi relatado anteriormente, deveria ser realizada pela Polícia Civil, de forma que a Polícia Militar pudesse disponibilizar o maior número possível de seu efetivo para desempenho da atividade de polícia ostensiva.
Há, sem sombra de dúvida, sérios problemas de administração e racionalização da atividade policial e, por conseqüência, com sérios prejuízos à segurança pública.
Na 3ª. Cia da Polícia Militar de Chapecó há também um setor, com a disponibilização de três (03) policiais, apenas para registro de Boletins de Acidentes de Trânsito.
Observe-se que o registro de acidentes de trânsito também é realizado pela Polícia Civil, embora, como já foi relatado, em muitas oportunidades, tal registro seria perfeitamente dispensável, eis que os fatos relatados não constituem crimes.
Não se pode deixar de anotar que o mesmo 2º. Batalhão da Polícia Militar possui um corpo de Comando, denominado Estado Maior, que conta com 13 oficiais, todos eles desempenhando funções burocráticas. Isso sem contar com o novel órgão denominado 4ª. Região de Polícia Militar, que conta com um total de sete (7) policiais militares, incluído o seu Comandante Geral, todos com desempenho de apenas atividades burocráticas.
Este denominado 4ª. Região de Polícia Militar é, sem sombra de dúvida, um órgão desnecessário, pois, na verdade, todas as suas atividades eram, antes, e poderiam ser, depois, desempenhadas pelo 2º. Batalhão da Polícia Militar. Sua criação justifica-se apenas como legitimadora da criação de novas funções de comando para contemplar e justificar um oficialato que apenas desempenha funções burocráticas.
É ou foi medida política, no mais perverso sentido da falta de planejamento e racionalização das atividades da Polícia Militar e de seu corpo funcional.
Nunca é demais repisar que a atividade precípua da Polícia Militar, sua razão de existir, é a atividade de policiamento preventivo ostensivo fardado. Polícia visível e presente, como instrumento inibidor da criminalidade. Uma atividade preventiva.
Como se pode perceber, a estrutura, a organização e a falta de planejamento e racionalização da mencionada instituição não dão margem a dúvida da necessidade de sua urgente reestruturação, de forma a corrigir-se as distorções apontadas, notadamente no que concerne a disponibilização de seu quadro funcional nas atividades de policiamento ostensivo. Aliás, sua principal razão de existir.
Se somarmos o Estado Maior e a 4ª. Região de Polícia Militar        ao contingente da 3ª. Cia de Polícia Militar, temos um total de duzentos e trinta e nove (239) policiais militares.
Considerando-se que os integrantes da 4ª. Região de Polícia Militar e o Estado maior desempenham atividades burocráticas, o efetivo total da Polícia Militar em Chapecó possui um contingente de 33,4% de policiais que atuam apenas em tarefas burocráticas.

3ª. Cia da PM - 219 policiais
Estado Maior -  013 policiais
4ª. RPM         -  007 policiais
Total              -  239 policiais
At. Buroc.      -  080 policiais

Os dados apurados no município de Chapecó\SC, no que concerne a função executada pela Polícia Militar, diferem das informações colhidas junto a SENASP[5], segunda a qual mais de 80% do efetivo das Polícias Militares desempenharia atividades operacionais, cabendo ao restante da tropa funções de apoio administrativo e outras.
Resta, evidentemente, identificar-se o que sejam atividades operacionais, ou até mesmo conceituar-se o que sejam atividades operacionais, para que se possam ter uma melhor visão dos serviços e atividades desempenhados pelas Polícias Militares.
Até o presente momento, pelo menos no Estado de Santa Catarina, temos observado uma completa disfunção das atividades dos policiais militares, em especial do corpo de oficiais, onde apenas uma pequena parcela exerce atividades operacionais. E, quando o faz, é, de regra, de forma eventual.
Voltando ao exemplo local, temos, atualmente, a contratação temporária de 13 (treze) pessoas, as quais desempenham atividades burocráticas.
A utilização de tal contingente de contratados temporários teria por objetivo possibilitar a utilização dos policiais que exerciam tal tarefa em sua atividade primordial: policiamento ostensivo.
Não é o que parece ter acontecido.
Ainda não pode fugir ao crivo de uma análise crítica a estrutura do 2º. BPM, órgão de administração e planejamento das respectivas Companhias de Policiamento, que seriam seus braços operacionais.
O 2º. BPM possui uma estrutura extremamente burocratizada, com a existência de órgãos que cumulam tarefas de outras organizações policiais e assemelhadas, com inegáveis prejuízos aquelas tarefas primordiais de policiamento ostensivo, como se demonstrará a seguir, excluídos o Comando e o subcomando.
P 1(Secretaria): 04 policiais
P 2 (Investigação): 10 policiais
P 3 (Planejamento): 04 policiais
P 4 (Manutenção\Armas): 14 policiais
P 5 (Relações Públicas): 02 policiais
Almoxarifado: 02 policiais
Informática: 03 policiais
Digitação TC: 02 policiais
Conservatório (Música): 02 policiais
Cartório: 03 policiais
Proerd: 03 policiais
Seção de Trânsito: 02 policiais
Expediente: 04 policiais
Recepção: 07 policiais
Total: 59 policiais

Inicialmente, necessário enfatizar que todos os policiais mencionados em atividade no 2º. BPM exercem, de regra, funções burocráticas.
Ainda que numa análise pontual, é mister ressaltar que a Polícia Militar, em Chapecó, dispensa 02 policiais para atuarem no Conservatório de Música, embora a Banda que havia tenha sido extinta.
Outros dois policiais destinam-se a digitação de Termos Circunstanciados, tarefa que competiria à Polícia Civil, sendo, portanto, cumulada entre as duas instituições.
Há ainda outros dois policiais destinados ao serviço de relações públicas da instituição (P 5), tarefa que, por exemplo, não existe em nenhum outra instituição policial civil, excetuada a Chefia da Polícia Civil.
Apenas, ainda como exemplo, é de se perguntar se a P 1 (Secretaria), com quatro policiais, ou mesmo o setor de expediente, com outros quatro policiais, não poderiam exercer as mencionadas atividades de relações públicas.
A Seção de Trânsito é outro órgão que deveria ser repensado, mormente agora que o município instituiu uma Guarda de Trânsito.
Não se pretende, na presente pesquisa, dizer o que se fazer ou como fazê-lo, entretanto é inegável constatar-se que não pode permanecer como está.
Há necessidade, impreterível, de uma reestruturação orgânica do órgão, pois a realidade constatada não condiz com o recorrente discurso, notadamente, de falta de recursos humanos e materiais, mormente quando um contingente considerável de policiais é destacado para a realização de serviços burocráticos.  
Mesmo admitindo-se a carência de recursos humanos, observou-se uma estrutura organizacional sedimentada em práticas burocráticas e excessivamente hierarquizadas que afetam sobremaneira a efetivação da atividade-fim da Polícia Militar com evidentes prejuízos a segurança pública.
O mais irônico de todas as questões levantadas no presente trabalho e que, para muitos, será entendido como fomentador da discórdia entre as Polícias Civil e Militar, são as conclusões do Projeto Segurança Cidadã – Modelo de Gestão Organizacional, da Secretaria Nacional de Segurança Pública – Ministério da Justiça, que transcrevo a seguir:

Resumo e Conclusão

A reversão da situação de degradação crescente da segurança pública exige linhas de ação de alto impacto. Procuramos elencar algumas delas neste ensaio. É evidente que a implementação das mesmas não é nada simples e, colocadas da forma acima, até impossível. Caberia, então, definir estratégias de mudança de longo prazo capazes de, através de encaminhamentos pontuais fortes, criarem oportunidades de mudanças no futuro. Por exemplo, permitir que as Guardas Municipais de cidades com mais de 50.000 habitantes se armem pode apontar nesta linha. É sabido que existe forte “zona de sombra” real entre as atribuições das Guardas Municipais e das Polícias Militares. Reforçar as Guardas (desde que estas nasçam já sob um novo modelo de atuação) hoje pode significar viabilizar a municipalização da segurança pública através de instituições de novo perfil. Esta estratégia poderia ser muito mais eficiente / viável do que a de tentar reformar as atuais Polícias Militares.

A Polícia Militar precisará mudar, ainda que não seja com a finalidade de melhorar a segurança pública, pelo menos para sua própria sobrevivência.
A beligerância que se fomenta hoje entre as Polícias Civil e Militar fazem-me acreditar numa estratégia de enfraquecimento de ambas as instituições, como razão e justificativa para implementação de uma “Nova Polícia”.
Inobstante todas as razões obscuras ou claras por trás dessas idéias, fica inequívoca a necessidade de uma mudança organizacional na Polícia Militar de forma a agilizar e tornar mais eficiente seus mecanismos operacionais.
Por derradeiro, embora bastante preocupante, seja destacar que do efetivo operacional, o cálculo deve ser feito sempre numa relação de um para três, ou seja, de cada três policiais, diariamente, somente um é que está em serviço, pois os demais, seguindo-se a escala legal de 24x48 ou 8x16, ainda que com algumas variantes, deverão folgar.
Em números absolutos a estimativa é que, diariamente, em Chapecó, a Polícia Militar disponibilize em torno de quarenta (40) policiais militares no policiamento ostensivo, para uma população de mais de cento e oitenta mil (180.000) habitantes[6].
Por derradeiro, importante esclarecer que desse efetivo de aproximadamente quarenta policiais (40) diários, apenas uma parcela atua no policiamento ostensivo (estima-se em torno de 15), posto que desse total uma parcela de policiais atendem a Penitenciária Agrícola de Chapecó e o Presídio Municipal.




[1] Boletim IBBcrim no. 199 – junho\2009.
[2] Artigo 144 parágrafos 4º. e 6º., da Constituição Federal.
[3] Lei 7.451, de 30.12.1988.
[4] A 3ª. Cia do 2º. Batalhão da Polícia Militar, por exemplo, disponibiliza três policiais apenas para o registro de Boletins de Acidentes de Trânsito.
[5] Secretaria Nacional de Segurança Pública – Perfil das Instituições de Segurança Pública\Polícia Civil e Polícia Militar – Setembro\2010.
[6] Dados do IBGE, referentes ao ano de 2010.