Conforme amplamente divulgado pela mídia, a Justiça
do Rio de Janeiro, atendendo pedido formulado pelo Ministério Público, passou a
permitr que a Polícia exija identificação de mascarados e leve-os para
Delegacias para esse fim, mesmo que não estejam praticando crimes. Essa medida
está se alastrado para outros Estados.
Ora, permitida está, via decisão judicial, a temida
prisão para “averiguação”, sem situação de flagrante delito, ao arrepio da
garantia expressamente prevista na Lei Maior (art. 5º, LXI): “ninguém será
preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou
crime propriamente militar, definidos em lei”.
É com muita perplexidade que, na atual quadra da
História, em que se pretende afirmar suplantado o obscuro período da Ditadura
Militar, a Constituição Federal seja tão amesquinhada.
Mais preocupante ainda é que essa grave violação à
Constituição tenha sido pleiteada pelo Ministério Público, constitucionalmente
incumbido de zelar pelo regime democrático e pelos direitos e garantias
indisponíveis, e chancelada pelo Judiciário, cuja legitimidade reside no zelo
das normas constitucionais, mormente das cláusulas pétreas, devendo exercer
papel contramajoritário.
Preocupa o fato de que, cada vez mais, ocorram
violações constitucionais dessa magnitude, em descarado desrespeito ao Estado
Democrático de Direito e inegável apego ao autoritarismo.
Sob a justificativa de manter a “ordem”, fere-se de
morte a Democracia. O que não se reconhece é que a existência de “ordem”
pressupõe respeito de premissas jurídicas básicas (direitos e garantias
fundamentais). O sistema penal, especialmente no tocante ao papel ostensivo e
investigativo das Polícias Militar e Civil, respectivamente, não prescinde do
respeito aos direitos e garantias individuais. Qualquer atuação à margem da
legalidade/constitucionalidade, ao invés de garantir a “ordem”, promove caos e
violência.
A vedação do anonimato jamais poderia ser utilizada
como subterfúgio para a prisão daqueles que usam máscaras. Para tanto, deveria
existir expressa previsão constitucional no sentido de possibilitar essa medida
coercitiva. No entanto, a Constituição é silente nesse ponto, não sendo
possível interpretar ampliativamente o disposto no art. 5º, IV, da CF/88; é
comezinho que as regras restritivas de direitos devem ser interpretadas
restritivamente. Ora, a Constituição veda o anonimato, e só. Não o tipifica
como crime e tampouco permite a prisão de quem se utiliza do anonimato!
A propósito, extrai-se: “IV - é livre a
manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”.
A bem da verdade, os defensores da prisão dos
mascarados não realizam interpretação, mas sim alteração do texto
constitucional. Afirmam que a Constituição diz algo que não é dito. E isso é
grave, na medida em que é negado o papel das garantias fundamentais, que, por
óbvio, é garantir, evitar arbitrariedades.
Conclui-se, portanto, que somente pode ser preso
quem for flagrado praticando um delito, esteja ou não mascarado.
A única máscara que deve ser retirada é a do
autoritarismo!
Cleiton Luis Chiodi - GEDIS
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