domingo, 1 de março de 2015

15 de março: o falso discurso da corrupção


“Quando você fala em corrupção, o que lhe vem à cabeça?... plim!” Algo assim integrava o material de Aécio da campanha das eleições de 2014.

A campanha é genial. Contudo, observem: a sugestão só é possível porque a idéia de que o PT é o único partido corrupto do Brasil (ou talvez “o mais” corrupto) foi implantada com sucesso. Os caras perceberam que, da mesma forma que quando a Radija dizia “inxalá” na novela as pessoas iam às lojas comprar produtos indo-árabicos, essas mesmas pessoas também comprariam a ideia do antipetismo como moda se houvesse um esforço tendencioso por parte da grande mídia.

Observem que curioso: no ranking de partidos corruptos do Tribunal Superior Eleitoral, o PT está longe do primeiro colocado (p.s.: quem falar que o judiciário é vendido do PT sem dúvida não conhece o perfil do pessoal que trabalha dentro do fórum – e olha que eu trabalho lá!). Mesmo assim, o PT é sempre o único a ser ligado diretamente à corrupção.

Essa sugestão (“PT = corrupção”) vem sendo paulatinamente repetida na mídia e, por meio da repetição, tornou-se verdade. O efeito colateral é o surgimento de um falso discurso contra a corrupção, um discurso ideologicamente voltado apenas contra o PT.

Prezados leitores, atenção: não estou defendendo o PT. Estou apenas tentando lhes mostrar um fenômeno que, na minha opinião, é um obstáculo na luta contra a corrupção.

Percebo que esse falso discurso da corrupção está sendo encampado por aqueles sujeitos que (dizem) irão às ruas dia 15 de março. Todavia, ao que se vê de suas manifestações, esses sujeitos não estão nem um pouco preocupados com a questão real da corrupção. Se o estivessem, certamente não sairiam contra um único partido (pois eles sabem muito bem que há muitos partidos corruptos no Brasil) – pelo contrário: se esforçariam para que as pilantragens de todos os partidos fossem investigadas, mesmo aquelas encobertas pela grande mídia. Todavia, nenhuma bandeira denunciando o mensalão tucano, nenhuma bandeira sobre o trensalão etc etc etc.

Ao contrário do que querem fazer crer, esse 15 de março não é apartidário, porque possui uma ideologia: um dos sentidos de ideologia é aquilo que oculta alguma coisa da realidade em nome de uma ideia coletiva. No caso, oculta-se a corrupção dos outros partidos colocando a corrupção do PT em evidência.

Na verdade, esses indivíduos buscam apenas algo para ir contra o PT, e usam a corrupção porque sabem que não podem revelar o que realmente lhes causa desconforto: a ascensão de muita gente pobre, as possibilidades cada vez mais equiparadas, o fato de que os filhos da antiga classe média precisam disputar com alguém mais do que somente entre si. O curioso é que muitos antigos pobres compraram esse discurso: isso aconteceu porque eles ascenderam socialmente e passaram a transitar pelos mesmos círculos que a antiga classe média, absorvendo dela esse ódio irracional anti PT. O resultado: as fileiras antipetistas aumentaram, e contam inclusive com os antigos pobretões.

Ao contrário do que se prega por aí, o antipetismo é um obstáculo na luta contra a corrupção. Por detrás das reivindicações antipetistas, os demais partidos conseguem articular seus contatos com muito mais conforto, afinal sabem que não levarão a culpa (que será atribuída toda ao PT).

Estou do lado daqueles que lutam contra a corrupção. Se ficar comprovado que o PT agiu de forma corrupta, estou do lado daqueles que pedem a respectiva punição. Da mesma forma o faço com todos os outros partidos. Todavia, não sou tão inocente (ou cínico) quanto essas pessoas que pregam o impeachment como uma forma de avançar contra a corrupção.

Corrupção é endêmica. Enquanto não houver reforma política séria, a corrupção continuará movendo o país. Estranho que o 15 de março não inclua nada além de impeachment e verborragia na luta contra a corrupção. Bradam um discurso pouco efetivo em termos práticos, mas muito bem arquitetado em termos políticos.

Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis

Nenhum comentário:

Postar um comentário