A banana atirada por um torcedor racista e comida
pelo jogador Daniel Alves em pleno campo de futebol europeu na semana passada
conseguiu produzir notáveis índices de publicidade. Deflagrando uma campanha
publicitária (pasmem) previamente arquitetada e aguardando apenas um fato assim
para ser disparada na mídia, rendeu tanto a venda de camisetas quanto uma febre
de pseudo conscientização das pessoas em relação ao racismo. A “hashtag” somostodosmacacos
ardeu em diversos perfis de redes sociais. Rostos sérios em fotos com bananas.
A luta contra o racismo. Será?
É preciso refletir onde se esconde o verdadeiro
racismo, hoje. Jogadores de futebol que recebem vários milhares de dólares para
praticar esporte não devem ser considerados os principais alvos desse fenômeno.
Talvez por isso Daniel Alves comeu a banana: na verdade, não havia espaço para
constrangimento.
É fato que o racismo, hoje, migrou para lugares
cada vez mais escondidos da nossa sociedade. Quero dizer: passou a ser não
verbal. Não dá mais para falar escancaradamente em racismo. É crime
inafiançável. Não dá para atirar bananas em campos de futebol. É feio.
Entretanto, dá para sentir medo porque um negrinho mal vestido está passando
próximo de ti na rua. Dá para desconfiar, deixar de contratar, sentir nojo
velado. Dá para falar baixinho “é coisa de preto”. Será que atos tão inocentes
são capazes de causar impactos significativos na sociedade? Obviamente sim.
Vamos aos dados: o percentual de negros
assassinados no Brasil é 132% maior que o de brancos. Em 2013, 73% dos
cadastrados no Bolsa Família eram pretos ou pardos. Em 2010, o IBGE conclui que
quanto mais rica a pessoa, menos chance tem de ser ela negra. Também mostra que
o número de detentos negros é 149% maior que o número de detentos brancos.
60,30% dos negros não procuram a polícia porque não acreditam nela (contra 39,7%
de brancos). Por causa dos homicídios, homens negros perdem 1 ano e 8 meses em
sua expectativa de vida; os homens brancos, por sua vez, perdem apenas 10 meses
nessa conta.
Voltamos às bananas: seriam elas capazes de
conscientizar a população em relação ao racismo? Pouco provável.
Há que se reconhecer: a expressão “#somostodosmacacos”
é simpática (as fotos com bananas não, essas são de péssimo gosto!). O
problema, contudo, é que a aproximação dos homens a
macacos-comedores-de-banana, no fundo, faz relembrar um sinal pesado da
discriminação racial: a crença de que alguns homens (os negros) seriam “menos
humanos” do que os outros (os brancos), por descenderem de “macacos
diferentes”. Na história, isso deu um ar científico à discriminação, fazendo os
nazistas acreditarem que os judeus eram inferiores e deveriam ser exterminados
– junto com os negros.
Dessa forma, reserva-se este texto para este único
objetivo: retirar o ar engraçadinho que envolveu as bananas e o racismo,
lembrando que o racismo de verdade não tem nada a ver com bananas, mas com
miséria, violência e hipocrisia. É preciso politizar o debate e lutar pela
afirmação e orgulho da identidade negra e não da invenção publicitária de uma
pseudo identidade com macacos.
Luís Henrique Kohl Camargo - GEDIS
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