Os xanxerenses passaram o feriado do dia 21/4/2015 recolhendo os destroços
de suas casas. Na segunda-feira, 20/4/2015, um tornado devastou praticamente
30% de Xanxerê.
Vi muitas pessoas
trabalhando em prol daqueles que sofreram a destruição. Outros, que não estavam
fisicamente lá, também auxiliaram com doações. Em momentos assim é possível
perceber a solidariedade humana, nossa capacidade inata de reconhecer e
compadecer-nos com os problemas de nossos semelhantes. Na tragédia, as
diferenças pessoais, ideológicas e de classe são momentaneamente esquecidas e
em lugar dela parece surgir um instinto de fraternidade, uma vontade de ajudar
simplesmente por ajudar, sem nada esperar em troca. No riso e no choro sentimos
mais intensamente o outro, e aí a conversa muda de tom. Ocasiões assim são
importantes para a gente perceber a condição de fragilidade e também a beleza
do ser humano.
Mas não apenas de grandes
tragédias sofre o homem. Há também aquelas tragédias invisíveis, que embora
façam sofrer tanto quanto (ou mais do que) perder uma casa, não reúnem a mesma
carga de solidariedade que o tornado foi capaz de reunir. É importante refletir
por que não percebemos as tragédias diárias sofridas pelo outro, julgando-nos uns
aos outros apenas com nossos preconceitos, quase sempre baseados em um conhecimento
superficial sobre os fatos. Nem sequer sabemos quem o outro é e já nos rogamos
capazes de afirmá-lo merecedor dos piores sofrimentos.
Por exemplo: um
adolescente perde o pai aos 13 anos de idade. Uma criança de 8 anos é
sexualmente abusada pelo seu tio. Um pai perde o emprego em uma demissão
massiva. Uma mãe vê-se obrigada a auxiliar o crime organizado para proteger seu
filho que está preso. O filho, que está preso, no passado tinha dificuldades de
aprendizado e não foi compreendido em sua escola. O professor, com pouca
estrutura material e emocional para trabalhar, não consegue dar atenção aos
problemas de todos os seus alunos... e por aí vai.
Uma tragédia silenciosa atinge
essas pessoas. Mas por que razão não levamos suas tragédias pessoais em conta
quando nos deparamos com um erro cometido por eles? Por que queremos puni-los
mais e mais precocemente?
Minha leitura é de que
primeiro: essas tragédias não são percebidas pela sociedade; segundo: elas não são
percebidas porque o discurso de ódio e a lógica retributiva da vingança nos
fazem cegos ante a realidade dessas pessoas. Lidamos com esses sujeitos como se
eles estivessem em situação de igualdade com os demais, mas não estão. Eles
precisam de atenção e se a sociedade não souber dar a devida atenção a eles, a
bomba pode estourar em nossas mãos.
Meus sinceros sentimentos
a todos que sofreram nesse vendaval. Dizer que o que importa de fato é estarmos
vivos (embora existam mortos e feridos dessa segunda) é verdadeiro, mas
insuficiente. Há um sentimento de dor muito agudo e traumático ao ver destruído
aquilo que foi fruto de nosso trabalho, aquilo que nos abrigou por tanto tempo.
Um pouco dessas pessoas foi levado embora também.
Todavia, caros leitores,
convido-os a, em meio aos destroços, refletir: esperar de quem sofre a tragédia
da fome, da miséria, da pobreza, o mesmo controle emocional do que aqueles que
não passaram por isso, esperar que “eles se virem sozinhos”, a meu ver é tão equivocado
quanto deixar de ajudar esses xanxerenses que perderam suas casas no vendaval, sob
o argumento de que “eles podem se virar sozinhos”.
Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis
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