quinta-feira, 20 de novembro de 2014

De nós, humanos do presente, para nós, humanos do futuro

A discussão em torno da questão ambiental cresce exponencialmente. Trata-se de um assunto que já foi alvo de muito preconceito e desconfiança, mas que hoje é um dos temas centrais do debate social, inclusive no direito. Enquanto as raízes do direito civil e do direito penal são quase tão antigas quanto o ser humano, o direito ambiental surge somente após a (quase) completa dominação da natureza pelo homem. Atualmente, não há mais predadores naturais que façam frente ao domínio humano, e o homem adquiriu a capacidade de, inclusive, destruir o próprio planeta onde vive. Foi a partir dessa percepção que se desenvolveu o direito ambiental.

Nascido no vácuo deixado pela catástrofe que foi o legado do otimismo tecnológico, o direito ambiental possui uma marca especial e, de certa forma, estranha: a preocupação com aquele que não existe, mas que, no futuro, existirá; o legado que nós, humanos do presente, deixaremos para nós, humanos do futuro. Contudo, o que mesmo nos obriga a preservar o mundo àqueles que nem sequer existem? Afinal, por que não simplesmente consumir tudo o que o mundo tem a nos oferecer, pois a vida não é mesmo uma só? A coisa não é tão simples assim.

Mesmo sem sabermos exatamente a razão, sentimos um elo ético que nos liga àqueles que virão. Esse vínculo ético existe devido a uma característica básica da existência humana: a condição do nascimento.

Todos nós nascemos em um mundo que já existia antes de nós, e utilizamos recursos que também nos antecederam (a casa de nossos pais, o seio de nossa mãe, a escola em que estudamos etc). De certa forma, estamos cientes de que fomos “alimentados” por uma geração que nos antecedeu, e sentimos que estamos “em débito” para com a humanidade. Só que não dá para reverter a história e fazer com que aquelas pessoas que nos alimentaram passem a ser alimentadas por nós (elas nunca serão mais novas do que nós... alimentaremos elas, talvez, devido à velhice, condição essa que, sabemos, provavelmente será também por nós atingida). Agora, onde projetamos essa sensação de “débito para com a humanidade”? Na geração que deverá ser por nós alimentada, ou seja, aqueles que virão.

Assim, a partir do momento em que o ser humano se deu conta de que possuía um domínio cada vez maior da natureza (podendo, inclusive, destruí-la), passou a assumir a responsabilidade pela manutenção do mundo (afinal, repito, a própria ação do homem pode destruí-lo).

Somos humanos, gregários, temos uma carga inerente de preocupação para com o outro. Às vezes nutrimos ódio, mas a raiva é algo tão natural quanto a alteridade. Porque somos humanos sabemos que recebemos das gerações pretéritas um mundo cujas condições nos permitiu sobreviver. Assim como acontece quando pegamos algo emprestado que, enquanto fica conosco, nos causa angústia até o momento da devolução, sentimos que devemos devolver às gerações futuras um mundo que nos proporcionou a vida. Sentimos o dever de possibilitar que as gerações futuras, que sequer existem, tenham um mundo onde elas possam nascer e, inclusive, sobreviver, quiçá melhor do que nós.


Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis

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