Greve de gari. Greve de médico. Tudo coincidência. |
Uma música emocionante toca ao fundo. Na tevê,
aquele programa chato de auditório. A história: um negro, pais pobres, estudou
em escola pública, trabalhou e sofreu como o diabo, estudou como um animal por
anos, hoje é juiz. Do outro lado da tela, um sujeito apático vê, ouve. Uma
reflexão: não há racismo. Não há discriminação. Todos têm as mesmas
oportunidades. O que acontece é que uns são mais determinados que os outros.
Desliga a tevê. Anda nas ruas e vê os garis que recolhem os lixos. Muitos,
quase todos, são negros. O sujeito sofre para pagar uma consulta médica. O
médico, quase sempre, branco. O sujeito passeia no fórum: sentado nas cadeiras,
aguardando atendimento, muitos, quase todos, negros; dentro dos gabinetes,
assessores, juízes e promotores, muitos, quase todos, brancos.
Entretanto, a realidade da televisão ainda é a que
prevalece. É muito lógico, afinal supostamente qualquer negro poderia
esforçar-se bastante, estudar muito, trabalhar honestamente e, aí sim, sem
dúvida seria igual a qualquer branco.
Para constatar o racismo imperante, bastaria ser
sincero, olhar para o lado, passear na cidade e ver, simplesmente ver. Bastaria
admitir o medo do negrinho andando atrás de ti; o nojo do negrinho recolhendo o
lixo; o escárnio a que são submetidos os costumes, danças e comportamentos
característicos dos negros.
Todavia, a abordagem individualizada que costumamos
empreender turva a nossa visão. Vemos apenas aquele um negro, aquele um branco,
aquele um pobre e aquele um rico. Isso nos impede de perceber o lugar previamente
reservado para cada uma dessas pessoas na sociedade e a batalha que cada um
desses sujeitos precisa enfrentar para não ser fatalmente colocado no espaço a
ele reservado.
É como se pretendêssemos analisar o comportamento
das formigas observando apenas uma delas, esquecendo-se de todo o ninho.
Consequência disso, a sociedade torna-se incapaz de
desenvolver medidas capazes de transformar essa realidade.
Aliás.
O problema é que a maioria das pessoas não está nem
aí para esse resultado. Tanto faz se branco ou negro está em posição social
privilegiada... na verdade, esse negócio de “posição social”, para muitos, nem
sequer existe. O que existe é trabalho e esforço. Logicamente, ninguém está nem
aí para o contexto em que os africanos do século XVI e os haitianos do século XXI
foram inseridos em nossa sociedade. Basta que se esforcem e vencerão. Raso
assim.
Aliás 2.
O problema maior não é o desdém do aliás 1. O
problema essencial é que muitas pessoas, muitas mesmo, um número imensurável,
têm nojo, ódio, receio desses sujeitos, querem-nos longe e essa é a razão do
desprezo, do descaso. O desdém é intencional.
Nesse contexto, conclui-se ainda haver muitos obstáculos
a superar para o surgimento de um cenário mais positivo em relação à questão da
discriminação racial no Brasil.
Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis
O seu pessimismo (na última frase) procede e o nosso não fica atrás. Já escrevemos que não acreditamos na diminuição de ocorrências racistas enquanto os maiores, e diretamente, interessados não lutarem para acabar com a invisibilidade do racista. O racismo "continuará não existindo" enquanto não houver interesse em definir o racista
ResponderExcluirTemos discutido muito a questão do racismo em nosso blog:
http://saudepublicada.sul21.com.br/category/discriminacao/
Sugerimos, em especial:
http://saudepublicada.sul21.com.br/2014/10/01/debater-o-racismo-sem-o-racista-e-muito-complicado-ou-quase-impossivel/http://saudepublicada.sul21.com.br/2014/10/17/a-invisibilidade-dos-negros-e-indesejavel-a-dos-racistas-e-paralisante/
Att.
Telmo Kiguel