quarta-feira, 27 de maio de 2015

O que ganhamos na derrota do distritão

Ontem, o sistema eleitoral apelidado "distritão" foi rejeitado pela Câmara dos Deputados. Defendido por Michel Temer e Eduardo Cunha, pelo PMDB em geral, o distritão propunha uma alteração no sistema de eleição dos deputados federais e estaduais e vereadores, que deixaria de ser proporcional e passaria a ser majoritário.

Atualmente, a quantidade de votos necessários para a eleição de um deputado ou vereador depende da quantidade total de votos de seu respectivo partido. Por essa razão, alguns candidatos com menos votos que outros acabam se elegendo. Com o distritão, o partido do candidato não influenciaria mais no resultado final. Os mais votados seriam eleitos, independentemente da legenda. No distritão, seria impossível que candidato com menos votos "passasse na frente" de candidato mais votado.

A princípio, a proposta parece muito lógica e justa. Na verdade, é simplista e falha. Não resolveria nada e de quebra acarretaria sérios efeitos colaterais. Vejamos.

Primeiro: no distritão, os candidatos de um partido disputariam não apenas com os candidatos dos demais partidos, mas também com os candidatos de seu próprio partido. Isso levaria à diminuição do número de candidatos, encarecendo o valor das campanhas (pois o candidato necessitaria de mais votos para se eleger). Quanto maior o valor da campanha, maior comprometimento do político com o financiador da campanha. Resultado: aumenta a corrupção. Isso sem falar na fragilização interna dos partidos, que também dá mais vazão a mais corrupção.

Segundo: o distritão dificultaria, quando não impossibilitaria, a eleição de candidatos de partidos minoritários, em especial aqueles que defendem direitos das minorias. Muitos menosprezam a função desses partidos em uma democracia, mas a representação das minorias é de fundamental importância. Quanto mais diversificado for o parlamento, melhor. Pense comigo: por exemplo, se você simpatiza com partidos da linha PT, imagine um Congresso com deputados apenas do PSDB e PMDB... e você, da linha PSDB, imagine um Congresso com deputados apenas do PT e do PSol! A diversidade, na democracia, possibilita um controle mútuo e o resultado são ações mais legítimas e maior debate político.

Com o distritão, essa diversidade partidária seria drasticamente reduzida. Resultado: todos perdem.

Terceiro: muitos dizem que o distritão tornaria as regras do jogo eleitoral mais compreensíveis. Isso não está errado, mas a coisa não funciona bem assim. Poucos sabem exatamente como funciona um computador, mas muitos utilizam e isso lhes traz benefícios. Da mesma forma, poucos sabem exatamente como funciona o quociente eleitoral, mas o resultado é benéfico à democracia, pois permite maior variedade de partidos e vertentes ideológicas no Poder Legislativo. Resultado do distritão: um sistema eleitoral mais fácil de entender, mas pior para a democracia.

Quarto: o distritão não ataca o problema central, que é a falta de representatividade política e a vulgarização da ideologia partidária no Brasil. Pelo contrário, o distritão aumentaria a prostituição ideológica do partido, pois bastaria um candidato popular, seja qual for seu discurso, para que sua eleição estivesse garantida. Resultado: se já temos crise de representatividade e esvaziamento partidário, com o distritão isso ficaria muito pior.

Amigos, existem várias, inúmeras outras razões para comemorarmos a rejeição do distritão, tantas que não cabem neste texto.

Como visto, a lógica simplista e a justiça superficial defendidas pelo distritão fazem esquecer seus efeitos colaterais capazes de fragilizar ainda mais a política brasileira. O distritão deixaria as portas ainda mais abertas para oportunistas políticos e para candidatos sem nenhum comprometimento com as questões públicas. Dar uma resposta ao povo sim, dar uma resposta simplista e retrógrada não. Reforma política sim, mas mudar para pior... não!

Manteve-se como está. Pelo menos, a festa dos políticos sem nenhum comprometimento e que se preocupam mais com seus benefícios particulares do que com a coisa pública não fica ainda maior.

Luís Henrique Kohl Camargo - Gedis

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