sexta-feira, 26 de maio de 2017

Há muito a TEMER*

É difícil escrever em um momento em que deveríamos gritar, mas ouço apenas um silêncio ensurdecedor. Sinto-me indignada, com raiva, assustada e só. Ao olhar em volta não vejo nada, nada além de rotina. Em meio ao caos, percebo uma ordem desesperadora. Indiferença, conformidade, e cada um em seu lugar. No lugar em que se está condenado a estar, seja por sua cor, gênero, classe social ou outras características que socialmente determinam onde devemos estar, o que devemos fazer e quem devemos ser. Há quem chame de vocação, há quem diga que se pode escolher o que se quer ser, mesmo que esta escolha seja limitada a certas possibilidades.
Mas ouso questionar, é uma escolha consciente do sujeito o lugar que ocupa ou este lugar que se ocupa no mundo é definido por variáveis que vão além de nós, de forma que muitas vezes, não permite que nos posicionemos, assim o que nos resta é aceitar. Somos estimulados à aceitação e conformidade o tempo todo, é um discurso comum. E imersos neste estado de conformidade a ficção satisfaz nossas relações, bombas calóricas satisfazem nosso paladar, mentiras satisfazem nossa audição. O que não nos afeta diretamente não nos interessa. E o que afeta? Pouco podemos fazer em relação a isso, então porque gastar energia, com o que pode ser ignorado e aceito?
Porém, em contrapartida, o que podemos fazer? Quando conscientes e sentindo necessidade de resistir, somos encurralados pela rotina diária e pelo trabalho. Não nos resta tempo para lutar, não nos resta tempo para resistir, não nos resta tempo para discutir, não nos resta tempo para ter voz. Precisamos sair de nossa zona de conforto, e perceber que para que algo aconteça é preciso agir. Sair da ilusão de que alguém vai fazer o que cabe a qualquer um, pois do contrário continuaremos culpando todo mundo, por algo que ninguém fez.

Monique Fernanda dos Santos


* Publicado na Coluna Pimenteiro na versão impressa do Diário Data X de 19 de maio de 2017

Nenhum comentário:

Postar um comentário