O REI ESTÁ NU*
Era uma vez, num
país não muito distante, uma chefe de Estado com dificuldades para
negociar com outros políticos importantes e influentes de seu pais.
Naqueles tempos
nebulosos, surgiram, com as mais variadas máscaras, pessoas
autointituladas guardiões da verdade e do bem. Um era pastor que
sempre esbravejava ao falar; outro fazia filmes adultos quando era
mais moço; havia um que usava toga e martelo em uma capital do Sul
daquele pobre país; outro ainda era um ex-militar obtuso e
oportunista... E ainda uma outra que era advogada, professora, e que
afirmava que quando tinha 11 anos jurou a um chefe de Estado
moribundo que zelaria por aquele país - esses profetas da verdade
começam cedo! Um poderoso clã se uniu a esse grupo e, como
controlava as comunicações daquele país, deixava todo mundo
informado das incríveis descobertas dos guardiões da verdade. A
verdade descoberta por eles era acessível apenas às pessoas de um
certo nível. Segundo eles, os menos inteligentes não podiam ver...
A grande revelação
é que eram todos corruptos, a chefe de Estado e sua agremiação
política. Só não via quem não tinha a inteligência suficiente
para ver. Muitos dos que passaram a ver o traje criminoso da chefe de
Estado atribuíam a dificuldade em enxergar dos seus apoiadores ao
regime alimentar: sanduíche de mortadela. Um grupo de
empreendedores, visionários e honestos, conforme diziam os profetas,
formado apenas por não comedores de sanduíche de embutido suíno,
ofereceu um totem amarelo, um deus da guerra emborrachado, para o
qual eram dirigidos os hinos de louvor e os versos decorados e
coreografados. Todos o carregavam consigo. Cassada a chefe de Estado,
foi empossado outro pelos guardiões. Esse outro era homem probo, só
não via quem ainda estava preso à dieta de embutidos e farinha, era
o que se dizia...
O véu da corrupção,
jogado sobre a chefe de Estado e seus aliados pelos guardiões da
verdade, liberava que os grandes corruptos agissem como queriam. Já
sobre aqueles que matam antes de delatar, foi posto um véu de boas
intenções, só não via quem não tinha a inteligência necessária.
Tal qual ratazanas esfomeadas tinham pressa. Era preciso oferecer o
sacrifício ao deus-pato-amarelo, tão esfomeado quanto àquelas.
Em pouco tempo
aqueles que saíram às ruas contra a chefe de Estado já não viam
mais a roupa de honestidade que o novo ocupante da cadeira e seus
apoiadores, atucanadamente trajavam: “mas como admitir isso? E a
vergonha, meu Deus?! Vão dizer que virei mortadela! Ou então, vão
dizer que eu estava errado, que fui enganado, que vergonha!”.
Ninguém mais via o véu, entretanto ninguém deles ousava dizer,
bradar, a plenos pulmões!
Até que um dia, um
fabricante de mortadela...
Bruno Antonio
Picoli - Professor
O REI ESTÁ NU*
Que podre era aquele
reino!
Cheio de
desaventuranças.
Quem? A chefe de
Estado
agremiada e sem
alianças.
Corrupta até o
talo!
Malfadada e em
retalho.
Desprovida de
esperanças.
Até que a dádiva
surge:
Os guardiões da
verdade.
Travestidos e
mascarados,
personificando a
sanidade.
Que pena: pois só
inteligentes,
visionários um
tanto regentes
sucumbem em
perplexidade.
Hino de louvor
e verso declarado
não foi suficiente
pra manter
anonimato.
E eis que o novo
ocupante
temerário e
ultrajante
vai perder o seu
cajado.
O novo reino
anunciado:
probo e iluminado.
não percebia que de
máscaras
mostra-se apenas um
lado
E que a verdade não
seja dita
pois a mentira é
atrevida
e pertence até aos
calados.
Fábio Soares,
Professor
*
Publicados na Coluna Pimenteiro na versão impressa do Diário Data X
de 26 de maio de 2017
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